Certo dia, lembrei-me das velhas épocas e dos meus amigos estranhos e eu perambulando tarde da noite numa busca infeliz por ônibus na Carls Goms. Oriundos de festas underground que rolavam pelos locais ao redor e depois do lindo pôr-do-sol e do jazz no Solar do Unhão - ah, que saudade da coxinha catupiry - , descobríamos aquela boemia esquizofrênica, onde o cheiro dos salgados gordurosos e das carnes de gato mal-assadas confundiam-se com o chorume que passeava por entre as pedras das calçadas.
Saíamos do Pelourinho - já “Patrimônio da Humanidade” – com suas casas pintadas e explosões de uma cultura que me soa ilustrativa, apenas. E descíamos para a Praça Castro Alves pensando em desafiar a morte e descer a Ladeira da Montanha naquele horário.
“Aonde, pai?!”
E seguíamos até um Campo Grande. Inicialmente passaríamos por aqueles cinemas onde eu tanto assisti aos filmes de Xuxa e dos Trapalhões na minha infância. Lembro como ontem de “Street Fighter”: o meu último filme no Glauber Rocha e “Harry, um Hóspede do Barulho” que seria o primeiro no outro, cujo nome eu não lembro, mas que teve o fim dos demais cinemas: viraram casa de culto. Ah, não era o Art 2 do Politeama – que virou casa de culto também.
E andando felizes, alegres e trôpegos naquela grande avenida. As putas de caras infantis e os travestis desproporcionais que passavam pela 7 Avenue quebravam pelas ruelas cheias de bêbados incautos e seguiam para o Pelô na procura de um turista abandonado.
Na seqüência tinha o Tchê Night Club, onde eu me acabava de rir com os leões-de-chácara piadistas – alguns amigos meus até hoje - e clientes sendo sugados pelas menininhas “pós 18” enquanto corpos de mulheres que nunca vi perambularem por Salvador ao dia rodopiavam nuas num espetáculo malfeito.
Era só ver quem estava rodeado de mulher e já se sabia: era o bobo da vez. “Pague uma merenda pra mim”, e vinha uma dessas buzinar no meu ouvido colegial. Eu, pobre, lenhado, com dez conto de consumação – leia-se dois refrigerantes – não era público-alvo; ela percebia e voltava-se para atacar outro. Raros não foram os momentos em que ouvi os pedidos de amor de bêbados depois de um Strip Tease particular – que não valia a pena e ainda custava 25 conto.
E ainda passávamos pela “Âncora do Marujo” – onde nunca entrei - e chegávamos ao “1001”, um bar GLS meio entocado, descoberto apenas pela numeração homônima, onde rolava um pagodão brabo, a cerveja era barata e as brigas de mulheres pelas suas respectivas namoradas era uma constante. Embriagados com o odor pesado de cigarro do local e surdos com o volume piegas de techno, continuávamos a trilhar a Avenida até chegarmos ao ponto do Vila. Era onde o frio batia e começávamos a aparentar sinais de cansaço.
Chegava o buzu. E todos iam para casa. ___________________________________ *Foto de Carlos Gomes, maestro e compositor brasileiro, autor da mundialmente consagrada ópera O Guarani.
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